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24 de jun. de 2010

A MÚSICA POPULAR NO BRASIL - Parte VI (final)




Nesta ultima parte de A Música Popular no Brasil, vamos ver como surgiu a Bossa nova, sob o enfoque de Nelson Lins de Barros, e depois, sob a ótica de Nelson Werneck Sodré, os motivos que impediram que a Bossa nova, nascida da classe média, e pretendendo ultrapassar o próprio nível cultural da classe média, não teve condições de penetração nas massas. (Nelson Werneck Sodré in 'Síntese de História da Cultura Brasileira'9ª ed., Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1981.)


Nelson Lins de Barros é referido na obra de Nelson Werneck Sodré pela sua profunda análise do movimento musical no Brasil: “Foi então surgindo na geração nova da classe média, uma preocupação de fazer samba de boa qualidade, utilizando o melhor espírito do samba antigo de bom gosto, com uma simplificação e mudança de acentuação no ritmo, uma harmonia mais rica, vinda por influencia do 'jazz' e dos impressionistas, uma melodia bem construída e desenvolvida. As letras tornaram-se poéticas, com maior valorização das palavras, das ideias em relação à melodia, excluindo rimas forçadas e lamentos banais. Os intérpretes perderam a tendencia à voz possante e rebuscada. Os instrumentistas procuravam a pureza do som e a sensibilidade em vez do malabarismo frio. Não se tratava de negar, destruir, superar. Tratava-se de atualizar a música brasileira ao nível do que havia de melhor no mundo inteiro, sem o que pereceria. Embora com influencias alienígenas, o movimento resultava nacionalista, desenvolvimentista”.


Um problema que a Bossa nova não conseguiu resolver, apesar de todo o esforço empreendido, é mostrado por Nelson Lins de Barros: “A 'Bossa nova', nascida na classe média, pretendendo ultrapassar o próprio nível cultural da classe média, não teve condições de penetração na massa. O sistema de rádio e televisão, cuja função precípua consiste em anunciar cosméticos, usa como chamariz a arte vulgar formada para a massa desprovida de cultura. Quando se dirige à classe média – diz Lins de Barros -, evidentemente para anunciar produtos da classe média, e tem de usar e tem de usar um chamariz da classe média, prefere importar música de outros países que já tem prestígio e popularização assegurada pelo cinema americano, pois são todos – programas, produtos, música e cinema – filhos do mesmo dono. (...) Não esquecer que todos os responsáveis pelo rádio, televisão, teatro, cinema, gravadores, boites, etc.,tem a mesma visão do mundo: são todos comerciantes. Foi essa a situação que o compositor Bossa nova teve de enfrentar – que todo artista tem de enfrentar: ou fazer das tripas coração para manter a dignidade – tornando-se um artista de elite – ou seguir a rotina, cair na maré da promiscuidade”.


No balanço que faz sobre a Bossa nova, o negativo e o positivo, Nelson Lins de Barros destaca que, no positivo, “embora não tenha atingido as massas (...) atingiu em cheio a classe média, a alta burguesia e, muito significativamente, os meios artísticos e intelectuais; embora não tenha evitado a invasão cada vez maior da música estrangeira, rivalizou-se realmente com o que havia de melhor no movimento musical internacional, superando mesmo as vanguardas de muitos países; embora o movimento não tenha conseguido elevar o nível da música popular como um todo, conseguiu influenciá-la de algum modo”.


Quanto ao balanço negativo da Bossa nova, Nelson Lins de Barros os enumera: “a falta de teorização, a falta de conhecimento de teoria musical, e, por último, a falta de maior número de intérpretes próprios”. Também destaca “a falta de união e no individualismo dos componentes do grupo”. Para Nelson Werneck Sodré “essa análise mostra, realmente, o ambiente que condicionou o aparecimento do movimento que se propunha renovar a música popular brasileira; no conjunto – diz Werneck Sodré – ressalta o caráter culturalmente desnacionalizador dos meios de massa, rádio e televisão, no que se refere à arte a que servem de veículo quase específico de divisão, a música”.


Aqui encerro o trabalho que desenvolvi em seis partes, sobre a música popular no Brasil. Para acessar a primeira parte do texto, basta clicar em A MÚSICA POPULAR NO BRASIL1ª Parte.


4 comentários:

  1. Oi, Pedro!

    Não há dúvida de que os envolvidos no movimento sabiam de antemão que um modo tão sofisticado de tocar e cantar samba não agradaria a massa. Tratava-se de um grupo cuja maioria era composta por intelectuais, e sabiam bem o que estavam fazendo. Principalmente se levarmos em consideração que boa parte deles já conhecia o mercado da música, ou por experiência própria, ou por conviver com personalidades do meio.

    Sabiam de todas as dificuldades "importadas" que serviam de barreira à música brasileira do ponto de vista comercial. É claro que haveria, como houve, tentativas no sentido de aumentar a fatia do bolo... Infrutíferas, claro. Talvez alguns tenham chegado a sonhar... Intelectual também sonha, claro! Mas a maioria mantinha os pés no chão e logo tratava de acordá-los, convidando-os a olhar o contexto em que estava mergulhada a sociedade da época. Música sempre foi um mercado difícil, como inclusive os autores por você abordados nesta série de posts, esclarecem... Imagine àquela ocasião! Era raro o mercado (não apenas o da música) que não tivesse que enfrentar o "paredão" americano...

    Deparo-me também com algo que, não tenho certeza, mas acho que comentei em outra ocasião... Sempre me incomoda o uso excessivo pela crítica da expressão influência do jazz, o que desnacionaliza, descaracteriza
    totalmente um movimento que até hoje dá IDENTIDADE, segue abrindo portas à musica brasileira lá fora.

    Influência é o que eu chamo de "palavra-acessório". No caso, palavra-acessório da crítica. Muitos não saem de casa sem ela. rsrs Infelizmente, ganha cada vez mais significados nada positivos. Quando se recebe influência de algo ou alguém, corre-se um grande risco de estar incorrendo em plágio, ainda que se apresente uma roupagem diferente na tentativa de distanciar-se do original para estabelecer uma identidade própria; influência, aliás, é palavra fácil de encontrar no contexto do crime.

    Estranhamente, nem a crítica favorável nunca preocupou-se muito com a escolha da palavra para expressar a admiração dos criadores do movimento pelo jazz. Mas, insisto, a bossa-nova era um modo sofisticado de tocar e cantar samba, fazendo-o descer pela goela da classe média e alta, além é claro, como é afirmado em seu post, de ser um modo de atualizar a nossa música em relação ao mercado internacional.

    Admirar e pensar a obra alheia, não necessariamente significa ser influenciado por ela, ou, mudando o foco para a literatura, terei que repensar muitos dos escritores e poetas que admiro.

    “Foi então surgindo na geração nova da classe média, uma preocupação de fazer samba de boa qualidade, utilizando o melhor espírito do samba antigo de bom gosto, com uma simplificação e mudança de acentuação no ritmo, uma harmonia mais rica, vinda por influencia do 'jazz' e dos impressionistas, uma melodia bem construída e desenvolvida."

    Aqui, quando o autor refere-se "ao melhor espírito do samba antigo de bom gosto" há uma referência clara principalmente à obra de Noel Rosa, - grande parte dela, diga-se de passagem, perfeitamente adaptável ao modo de tocar bossa-nova. Semente brasileira. Luz brasileiríssima que é nublada pela escolha da expressão influência do jazz no decorrer da frase do autor. Que pena!

    (continuando...)

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  2. É preciso abrir parênteses também para falar de críticos ferrenhos, que fizeram fama atacando o movimento, insistindo em olhar a bossa nova como surgida sob forte influência (olha a palavrinha aí) do imperialismo americano. Os rapazes de classe média, costumavam escrever alguns críticos, sobre aqueles que integravam o movimento, o que não só denotava preconceito, mas fazia-os esquecer de olhar para a própria vida; para o próprio "rabo."

    É no mínimo estranho colocar sob essa ótica alguns compositores e letristas que, nem tanto tempo assim depois, fixariam as bases da mpb, e trariam a público, enquanto a censura prévia arroxava as redações de jornais e revistas, as principais mensagens de protesto à época da ditadura. Não eram ainda os rapazes da classe média?

    Por detrás de todo aquele discurso, teimava-se em ignorar que era mesmo muito provavel que só os rapazes da classe média seriam capazes de reagir, lá atrás, quando do surgimento da bossa nova, e cá na frente, em relação à ditadura. Por que? Fácil! Num país que nunca deu a devida atenção à educação, eles lá estavam, educados, informados, cultos e, para nossa sorte, com um olhar humanista sobre o contexto político, social e econômico do momento que viviam.

    E vou parando por aqui, Pedro, porque quando gosto do assunto tenho tendência a escrever verdadeiros testamentos. Mas sempre lembrando que sou só uma curiosa apaixonada, e não - nunca! - a dona da verdade. Afe! rsrs

    Bjs, Pedro, e inté!

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  3. Pedro,
    Acabei de ler as três últimas postagens sobre a bossa. Faço parte daquele grupo inculto, sem acesso e incentivo "nada". Conhcemineto aqui, nasce por afinidade, curiosidade. E em relação à música, sempre ouvi o q se passava nas rádios, ou seja, o que queriam q eu de forma limitada conhcesse. Hoje fujo deste veículo por conta de um refinamento quem venho adquirido. E conhcer um pouco da trajetória da música me faz cada vez mais buscar aquilo que nunca me ofertaram...
    obrigada por estas postagens. Informação de qualidade é algo q, mutas vezes, não encontramos sendo disseminada em todo canto.

    Abraços

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  4. Pedramigo

    Só uma palavra, que aliás, são duas...
    Aprendi e adorei.

    Nuito obrigado E boa sorte para o Brasil, por quem torço agora!

    Qjs à Tais e abs para tu

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Meu abraço a todos os amigos.

Pedro Luso de Carvalho