- PEDRO LUSO DE CARVALHO
ANTERO DE QUENTAL, que foi registrado no Cartório Civil como Antero Tarquínio de Quental, nasceu a 18 de abril de 1842, em Ponta Delgada, Ilha de São Miguel, Açores, onde passou sua infância. Era filho de Fernando de Quental e D. Ana Guilhermina da Maia, ele açoriano, ela natural de Setúbal.
Em São Miguel, fez seus primeiros estudos até ser matriculado no Colégio do Pórtico, dirigido por António Feliciano de Castilho, no Continente. Aprendeu desde tenra idade as línguas francesa e inglesa. Na intimidade que viveu com a família Castilho, recebeu as primeiras luzes de latim, em curso por este ministrado.
Estudou em Coimbra, onde se fez notar pelas atitudes revolucionárias e pelo arrojo inovador das ideias. Foi o provocador e líder da célebre “Questão Coimbrã”, a qual, mais que um combate a Castilho, representou um golpe contra o romantismo e a afirmação de um espírito novo: o da chamada Geração de 1865.
Vida agitada e dramática, sua figura humana ainda se distingue mais do que a figura intelectual. Teve ímpetos para a ação, e chegou a fundar sociedades revolucionárias (movimentos políticos filiados à doutrina socialista); esses ímpetos sucediam, porém, crises de solidão e pessimismo. Então, refugiava-se em Ponta Delgada, e por muito tempo ninguém tinha notícia de sua existência.
Estudou filosofia e problemas sociais, chegando a elaborar um sistema pessoal de ideias, do qual só publicou fragmentos. Essa tendência filosófica está refletida na sua poesia, das mais altas e originais da língua portuguesa. É de se lhe notar a predileção pelo soneto, forma que havia sido desdenhada pelos românticos.
Em data de 28 de setembro de 1858, matricula-se na Faculdade de Direito de Coimbra. Estava então, com dezessete anos. Eça de Queirós dirá, na sua evocação da mocidade de Antero de Quental:
Coimbra vivia então uma grande atividade, ou antes num grande tumulto mental. Pelos Caminhos de Ferro, que tinham aberto a Península, rompiam cada dia, descendo da França e da Alemanha (através da França) torrentes de coisas novas, ideias, sistemas, estéticas, formas, sentimentos, interesses humanitários… Cada manhã trazia a sua revelação, como um sol que fosse novo. Era Michelet que surgia, e Hegel, e Vico, e Proudhon; e Hugo tornado profeta e justiceiro dos reis; e Balzac com o seu mundo perverso e lânguido; e Goethe, vasto como o Universo; e Poe; e Heine, e creio que já Darwin, e quantos outros!
No período que compreende os anos de 1858 a 1860, época em que Antero termina o segundo ano da faculdade, publicou os seus primeiros versos no jornal O Acadêmico, que não passou de três números, estreava nas colunas dos Prelúdios Literários em 1859, com o poema Quero-te muito, assinando apenas as iniciais de seu nome A. T. Q.
Na época de sua estreia, 1859, que não foi brilhante, a poesia portuguesa sofria o baque com a perda de nomes representativos do romantismo; cinco anos antes, morria Garret, Herculano faria uma nova edição sua, Poesias em 1860 – fazia dez anos que não as reeditava. O ano de 1863 marca o início da prosa de Antero, quando começa a afastar-se do romantismo.
Concluiu o curso de Direito em julho de 1864. Nos últimos anos do curso, eram seus companheiros preferidos os cientistas, matemáticos e naturalistas. Mudara com determinação a forma de encarar a sua atividade literária. A fase sentimental de Antero de Quental – o poeta das Primaveras românticas – estava finda.
Antero de Quental chegara aos quarenta e nove anos, depois de ter trilhado um caminho com êxito no plano intelectual, mas sem ter tido tempo para realizar todos os seus sonhos dos vinte anos de idade, quer no campo do pensamento e da mentalidade, quer no território da política e da organização social.
A neurose que acometera Antero foi responsável pelo seu abatimento físico e mental que cerceou seus planos em várias áreas de sua atuação, quer como crítico e moralista, quer como filósofo e poeta.
O poeta retorna de S. Miguel para escolher uma família que pudesse cuidar de suas duas filhas adotivas, mediante uma mesada. Sua intenção, depois disso, era voltar com sua irmã para Lisboa, mas é na ilha que vive os seus últimos dias.
Depois de comprar um revólver numa loja de quinquilharias da parte baixa da cidade, o caixeiro a embrulha em três folhas de papel; como diz João Gaspar Simões, pretendia Antero dirigir-se ao Campo de São Francisco, mas antes resolveu passar pela casa onde deixara suas filhas adotivas.
O Campo de São Francisco está deserto. Antero de Quental senta-se num dos bancos, junto ao Convento da Esperança, desfaz o embrulho, retira o revólver e leva o cano à boca e detona a arma; muito ferido, puxa novamente o gatilho, e desta vez o tiro atinge-lhe o cérebro.
Isso ocorreu às oito horas da noite. O poeta teria ainda que suportar grande sofrimento, pois somente às nove horas, assistido por médicos, chamados de emergência, numa cama da enfermaria do Hospital da Misericórdia, dá o seu último suspiro. (Antero de Quental falece no dia 11 de novembro de 1891, em Ponta Delgada, Açores, aos 49 anos de idade.)
No Pequeno Dicionário Enciclopédico Koogan Larousse, sob a direção de Antônio Houaiss, o verbete sobre Antero de Quental está assim redigido:
Poeta e prosador português, Ponta Delgada, Açores (1842-1891), espírito angustiado pela dúvida metafísica e religiosa, e, ao mesmo tempo, homem de ação voltado para as ações revolucionárias da época, foi líder de sua geração literária e de movimentos políticos filiados à doutrina socialista. Atacado de grave neurastenia acabou por suicidar-se. O timbre filosófico de sua poesia, trabalhada com lavor, é reflexo de pungentes conflitos interiores, que lhe marcaram a vida. Antero forma com Camões e Bocage, a trindade dos grandes sonetistas portugueses, Obras principais: Odes modernas (1865), Sonetos (1890).
Obras principais de Antero de Quental: Sonetos de Antero, 1861; Odes modernas, 1865; Primaveras românticas, 1871; Os sonetos completos de Antero de Quental, 1886; Raios de extinta luz, 1892; Bom senso e bom gosto, 1865; A dignidade das Letras e as Literaturas Oficiais, 1865; Sonetos (1890), Prosas (3 vols.), 1923, 1926 e 1931.
Segue o Soneto de Antero de Quental intitulado:
À uma amiga (in João Gaspar Simões, Antero de Quental. Lisboa: editora 1962, p. 245):
À UMA AMIGA
Antero de Quental
Àqueles, que eu amei, não sei que vento
Os dispersou no Mundo que os não vejo…
Estendo os braços e nas trevas beijo
Visões que à noite evoca o sentimento…
Outros me causam mais cruel tormento
Que a saudade dos mortos… que eu invejo…
Passam por mim, mas como que têm pejo
Da minha soledade e abatimento!
Daquela primavera venturosa
Não resta uma flor só, uma só rosa…
Tudo o vento varreu, queimou o gelo!
Tu só foste fiel - tu, como dantes,
Inda volves teus olhos radiantes…
Para ver o meu mal… e escarnecê-lo!
REFERÊNCIAS:
SIMÕES, João Gaspar. Antero de Quental. Lisboa: Editora Presença, 1962.
LINS, Álvaro. HOLLANDA, Aurélio Buarque de. Roteiro Literário de Portugal e do Brasil. Vol. I. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1966.
LAROUSSE, Koogan. Pequeno Dicionário Enciclopédico Koogan Larousse. Direção de Antônio Houaiss. Rio de Janeiro: Editora Larrousse do Brasil, p. 1476.
Boa noite literária, amigo Pedro!
ResponderExcluirOntem mesmo conversávamos com padrinho sobre a tríade portuguesa... Hoje você posta Antero.
Pena que não tenha testado um flor da primavera...
Quiçá a amiga seja a mais formosa flor?!
Pena o seu final tão conturbado e neurótico!
Tenha uma ótima noite!.
Abraços fraternos
Un articolo notevole, in cui si conosce più da vicino un autore saggio e molto interessante...
ResponderExcluirCari saluti,Pedro, silvia
Interessante a biografia autor, tantas vezes até nos facilita entender seus escritos e a poesia muito linda ! Gostei! abraços, tudo de bom,chica
ResponderExcluirUm lindo poema.
ResponderExcluirAs biografias, na minha opinião, sempre falam tão pouco sobre quem as pessoas foram realmente, não é?
Interesante biografía.
ResponderExcluirMuy triste e impactante el final de su vida.
Un beso.
Excelente publicação! Adorei :)
ResponderExcluir--
Lembra-ste do meu primeiro sorriso?
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Beijo, e um excelente dia...
À uma amiga de amigo para amigo.
ResponderExcluirGrato amigo Pedro pela escolha e tão bela profunda apresentação deste Quental, tão forte e diferente em seus sonetos, como o apresentado.
Abraços amigo e que tudo flua belamente para vocês.
Boa noite Pedro,
ResponderExcluirGostei muito de conhecer um pouco mais de Antero de Quental, infelismente terminou sua vida de maneira trágica!
"É preciso passar sobre ruínas, como quem vai pisando um chão de flores!"
Antero de Quental
Beijos e ótima noite!
Antero de Quental, um dos melhores poetas Portugueses.
ResponderExcluirGostei de ler! Obrigada pela partilha:) Amigo Pedro, Um beijo de paz e bem!
Seja muito feliz, junto com todos os que adora!
Gostei de ler esta biografia de Antero de Quental.
ResponderExcluirUm abraço e continuação de uma boa semana.
Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros
Pedro, você sempre coloca nas postagens os fatos mais característicos da personalidade dos escritores que escolhe para nos apresentar. Muitas delas me eram desconhecidas e gosto muito de sabê-las dessa forma, em uma espécie de homenagem. Essa melancolia, se é que podemos chamar assim, foi companheira de granes nomes da literatura mundial. Gostei muito, tanto da biografia quanto do poema eleito. Grande abraço para você e Tais.
ResponderExcluirEse último terceto es en verdad especial. Ver la expresión, entenderla, comprenderla, asumirla.
ResponderExcluirCuando el poeta da con la palabra exacta, es un placer bogar a su lado, todo queda diáfano. La intención de un gesto, de una sonrisa.
Y eso que combatió el Romanticismo, como bien cuentas, sin captar que militaba en la misma trinchera emocional que acabó con él.
Qué grande la poesía cuando el poeta se entrega por completo.
Olá, Pedro! Que denso...a biografia e o poema muito profundo. Despertou-me a curiosidade de ler outros poemas, o que farei, sem dúvida.
ResponderExcluirAbraço!
Obrigada pela postagem! Hoje fiquei sabendo porque gostei tanto de Antero de Quental nas aulas de literatura portuguesa...eram seus ideais que me atraiam através de sua poesia, A biografia como você a descreve
ResponderExcluirabre os nossos olhos;
Um abraço
uma verdadeira lição sobre Antero de Quental
ResponderExcluirtem pormenores a tua dissertação que eu ignoráva
ou terei esquecido.
Antero é um poeta que entrou pela porta grande na História da Literatura Portuguesa.
Bem Hajas
forte abraço, meu caro Pedro Luso
Una bellissima ed approfondita biografia di Antero de Quental che mi ha colpita piacevolmente. Grazie Pedro Luso. UN caro sluto!
ResponderExcluirÉ sempre um gosto ler Antero de Quental. A sua "lição" sobre ele é fantástica. Antero é uma figura muito importante da cultura portuguesa.
ResponderExcluirUma boa semana, meu Amigo Pedro.
Cuide-se bem.
Um beijo.
Obrigada pela importante partilha. Antero de Quental foi um grande poeta e não só. Merece ser recordado. Não conhecia a história dele tão detalhadamente. Obrigada
ResponderExcluirBeijinhos
Feliz ideia destacar Antero de Quental, um poeta maior da literatura portuguesa.
ResponderExcluirPara uma vida tão valorosa, um triste fim.
Beijo, meu amigo Pedro.
Querido amigo Pedro, antes de tudo quero agradecer o carinho lá no meu espaço,obrigasa meu amigo!
ResponderExcluirDe volta das férias e aprendendo aqui, sim, aqui se aprende com essas belas biografias que nos dão noção dos valores dos que deixaram rico legado!
Amei ler sobre Antero de Quental, não conhecia, o soneto magnífico me fez sentir as boas energias!
Abracos bem apertados!
Grata por esta partilha. Um grande Sonetista, que deixou, apesar de ter desaparecido muito cedo, uma grande obra.
ResponderExcluirUm abraço
Gostei de encontrar aqui Antero de Quental um poeta de quem não tenho lido muito mas que aprecio.
ResponderExcluirAbraço e saúde
Impressionante, como há tanta genialidade atrás de almas amarguradas, na vertente artística...
ResponderExcluirAdorei conhecer um pouco mais da obra de Antero... e da sua detalhada biografia!
Belíssima publicação, Pedro!!! Beijinhos
Ana