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4 de set. de 2016

[crônica] PEDRO LUSO – Apartamento à venda





    [ESPAÇO DA CRÔNICA]


    APARTAMENTO À VENDA
        – PEDRO LUSO DE CARVALHO


O casal comprou o apartamento no centro da cidade, ainda na sua fase de construção. A incorporadora comprometeu-se entregar o imóvel no prazo de doze meses, na forma do contrato. Depois que se aposentaram, marido e mulher ansiavam pela mudança. Estavam entediados com a vida que levavam no bairro, há muitos anos.
O casal estava familiarizado com o centro de Porto Alegre, onde trabalharam por muitos anos, como funcionários da Assembleia Legislativa, cuja sede fica em frente à Praça da Matriz. Aí costumavam descansar após o almoço, sob suas grandes árvores, de onde avistavam o Rio Guaíba, entre os edifícios.
Portanto, logo estariam livres dos problemas com as quais se deparavam no bairro, com as tantas dificuldades para fazerem suas compras, e ainda a distância do Teatro São Pedro, onde viam quase todas as peças que eram levadas, sempre na dependência do ônibus, da lotação, e às vezes do táxi, com preço mais salgado.
A localização do apartamento, que compraram, não podia ser melhor para eles, que sempre gostaram da Rua dos Andradas, mais conhecida como Rua da Praia, desde os primeiros anos da cidade. Ao lado, fica a Igreja das Dores, em frente a Casa de Cultura Mário Quintana, de onde se vê o Centro Cultural Usina do Gasômetro.
O marido frequentaria os bares, nas imediações da Praça da Alfândega, onde se encontraria com velhos amigos, muitos já aposentados. A mulher não teria dificuldade para frequentar missas e novenas na Igreja das Dores, mesmo sem a companhia do marido, que era um pecador, como sempre dizia às amigas.
Depois da exaustiva espera, o casal iria para o novo lar. Marido e mulher chegaram antes do caminhão de mudança. Percorreram um longo corredor, no andar térreo, até chegarem em frente ao número onze. O marido estava visivelmente nervoso quando abriu a porta do apartamento pela vez primeira.
A mulher ascendia as luzes, enquanto o marido abria as duas janelas, uma lateral e outra de fundos, quando sente uma pressão forte no peito ao ver que o apartamento estava embutido entre dois altos muros, com pouca iluminação natural e desprovido de qualquer vista, em razão da existência dos malditos muros de cimento.
No mesmo dia, o caminhão retornou com a mudança para a velha casa ensolarada, no bairro Petrópolis. Os móveis foram colocados nos seus lugares de origem, como estavam antes. O marido ajuizou ação contra a empreiteira para desfazer a compra, com a vantagem de ter sido indenizado com altos valores.
Hoje, marido e mulher estão felizes no antigo ninho, com o dinheiro que não estava nos seus planos, mas, como costumam dizer: “chegou em boa hora!”. Fizeram depois os necessários reparos na casa, além do plantio de árvores, que servem de moldura ao bem cuidado jardim. E dizem sempre: “O nosso bairro é um paraíso!”.


*    *    *



36 comentários:

  1. Ótima semana!!!!!!!!! Beijos

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  2. Que bom que teve um final feliz e puderam retorbnar ao antigo apto. Imagina se esse tivesse entrado no "negócio"...

    Lindo te ler e só não entendi por qual motivo cabia à mulher ir à missa e ele folgando nos bares?rs Essa não colava!! abraços, linda semana,chica

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  3. Uma belíssima crónica... que evoca a veracidade do velho ditado... às vezes, há males, que vêm por bem...
    Abraço! Boa semana!
    Ana

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  4. Golpistas! (essa palavra vai pegar...). Bem, se fosse comigo teria ficado enlouquecida, gosto de sol e luz dentro de casa. Abrir as janelas e dar com um paredão... é frustrante.
    Porém isso acontece, sim, estamos cansados de ver nos noticiosos casos parecidos ou piores. Jamais escolheria apartamento na planta. Aliás, foi o que fizemos.
    Ótima crônica, colocaste um pouco de tua vivência como advogado dando um toque de romantismo na cidade...ficou leve.
    Pois é... e a mulher na igreja? rsss

    Beijinho - aqui do lado.

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  5. Es triste verse obligado a vivir en un edificio de apartamentos desde donde sólo se pueden ver... más edificios.
    Abraços.

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  6. Como se suele decir: más vale malo conocido que bueno por conocer... y a esta pareja le vino estupendamente, (aunque les gustara el cambio por tenerlo todo más cerca), seguir en su nido, donde más allá de sus paredes, la vista era maravillosa.
    Muy bonito pasearse por tus letras y los lugares que citas.
    Un abrazo.

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  7. Interessante! Chega uma altura da vida em que a casa fica vazia, se torna grande demais e se faz necessário mudar para locais mais pequenos e bem localizados. Sempre vivi em casa, mas há muitos anos moro num apartamento bem no centro da cidade; não preciso de pegar no carro o que, tendo em conta o avançar dos anos, é uma grande coisa. Neste caso, fizeram eles muito bem; ficarem emparedados seria uma vida triste. Um beijinho Pedro e uma boa semana
    Emilia

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  8. O seu talento de cronista aqui bem à vista. Claro que só podia ser assim. Perante uma casa nova e bem situada, mas sem luz, a casa antiga pareceu muito mais bonita...
    Uma boa semana.
    Beijos.

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  9. Una crónica muy bien contada, Pedro.
    Al final, nada como lo conocido. Y es que cuando deseamos cambiar nuestra manera de vivir, corremos el riesgo de equivocarnos.
    La pareja de tu relato, volvió en busca de la luz de sus vidas.
    Un abrazo.

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  10. Não podemos simplesmente fazer as coisas aleatoriamente, seguindo os impulsos dos nossos sonhos...
    Precisamos ter muita certeza. Mesmo que contrarie as nossas expectativas.
    Muito bom e esclarecedor teu texto, Pedro.
    Uma linda e abençoada semana, e obrigado pelo comentátio!
    Abraços!
    Mariangela

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  11. Sem paisagem, não dá. Nem que a alma seja feita de lindas paisagens, aquilo que está à nossa janela importa, e muito, para o nosso bem-estar. É preciso ter verde; se não houver verde, que haja céu.

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  12. hoje em dia eles derrubam casas antigas com grandes quintais e constroem prédios de apartamentos minúsculos cujo preço por unidade é escandaloso. Como dizia Caetano " a força da grana que ergue e destrói coisas belas".
    Um abraço

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  13. Afortunadamente que pudieron echar marcha atrás y continuar su vida tranquila y agusto.
    Un saludo.

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  14. por aqui se diz que o "crime não compensa"...
    mas não há regra sem excepção.

    não compensou o criminoso "pato bravo", mas reconciliou o simpático casal com o seu habitat natural.

    e tudo vai bem...

    Pedro, a subtil ironia de teus textos é irresistível

    abraço, meu amigo

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  15. Pois então meu caro Pedro, o problema dos muros é sério. Já postei, há alguns anos, um poema lá no meu modesto espaço, dissertando sobre o tema. A conclusão do poema sugere a ida para os morros, para que a visão das belezas naturais da nossa cidade não seja sequestrada dos nossos olhos. Sobre a cronica anterior, da senhora de meia idade, pois então, eu também não tenho interesse na votação. Irei até à urna, porque a democracia me obrigado a tal...É triste, né amigo, nós que já brigamos por eleições...
    Um abraço. Tenhas uma ótima semana.

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  16. Rua dos Andradas, Casa de Cultura Mário Quintana, Usina do Gasômetro...exatamente onde estou e meu caminho de todos os dias, com vista para o Guaíba.

    Realmente se fosse para ter como vista um muro de cimento, melhor voltar ao antigo lar. E ainda bem que tudo terminou bem.

    Mais uma ótima crônica, Pedro. E ilustrada com uma lindíssima tela.

    Abraços/Boa semana!

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  17. ¡Hola Pedro!!!

    Muy bueno el relato como siempre es tu costumbre, uno puede ser feliz en cualquier parte, no se necesita una gran casa en un lujoso lugar, lo que necesitamos es mucho amor y comprensión entre dos personas comparten su vida.

    Me gustó el texto, pero la pintura me enamora, es un bonito cuadro, felicidades al pintor y a ti por tener tan buen gusto a la hora de escoger.

    Ha sido un placer como siempre, aquí se respira aromas de empatía.
    Te dejo mi inmensa estima y gratitud.

    Un beso y se muy -muy feliz.


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  18. OI PEDRO!
    É, MUITAS VEZES SONHOS ACALENTADOS POR LONGO TEMPO, QUANDO SE TORNAM REALIDADES, NÃO SÃO NADA DAQUILO QUE PENSÁVAMOS, POIS O BOM MESMO, É O QUE TEMOS, ACONTECE.
    ÓTIMA CRÔNICA.
    ABRÇS
    http://zilanicelia.blogspot.com.br/

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  19. Gostei da história com um final muito feliz.
    Um abraço e boa semana.
    Andarilhar

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  20. Muy ocurrente y es casi filosófico. No valoramos lo que tenemos porque pensamos que otras cosas son mejores. No hay nada que lo tenga todo y que sea perfecto. Lo mismo sucede con las personas.
    Buen relato. Saludos cordiales.

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  21. Agradeço a visita ao meu Blog. Viver onde não se tem uma bonita vista, apenas paredes não não vale a pena.
    Um abraço, Élys.

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  22. Pedro,

    Além da excelência da sua crônica na expressão literária,
    além da excelente e cativante narrativa; tem algo que me chama
    atenção e aprecio muito, que é a mensagem filosófica sábia
    sobre a vida. Às vezes a vida nos conduz a caminhos com
    resultados melhores do que o planejado, como aconteceu
    ao casal da sua crônica.
    Parabéns, meu amigo.
    Preciosa leitura sempre aqui!
    Abraço.

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  23. Nem sempre as mudanças são o que esperávamos, ainda bem que teve um final feliz.
    Adorei o conto.
    Um abraço
    Maria

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  24. Um sonho acalentado durante tanto e quando se realiza vem a decepção. Ainda bem que este teve um final feliz
    Um conto magnífico Pedro
    Um abraço

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  25. Passo per un rapido saluto. Confesso di non essere ancora in grado di concentrarmi sui testi, quindi di capire cosa sto leggendo e lasciare un commento. Mi dispiace.

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  26. A veces, estimado Pedro, nos hace falta descubrir otras imperfecciones, para saber apreciar mejor lo que tenemos.

    Saludos chilenos.

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  27. Ufa... ainda bem que no final deu tudo certo, porque aposentado precisa de paz... e viver feliz.
    Beijo

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  28. Amigo Pedro.
    Sería recomendable que su relato lo leyeran todos aquellos que al llegar la jubilación deciden cambiar de residencia sin hacer antes una prueba de estancia y visitar todo lo que será su nuevo destino. Barcelona podría ser un espejo.
    Hay quienes han revisado a fondo donde van a vivir, aciertan, y consiguen integrarse muy bien a través de sus muchas opciones urbanas. Pero tras el deslumbramiento inicial, existen muchas personas que echan a faltar la panorámica que veían desde su casa, los horizontes, los sonidos y el silencio, ese riachuelo que oyes aunque no lo veas, la seguridad. Y esa conversación con tus amigos de siempre de los que un solo gesto ya te da la respuesta. No, no hay que precipitarse.

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  29. Olá meu amigo Pedro o cronista do Sul que nos brinda com o lado bom do cotidiano.
    Ainda bem que não passaram por um calvário e promessas feitas para todos os santos da igreja pela mulher.
    Mas Pedro isto me faz lembrar dos anos 60 lá no interior das Minas Gerais de onde venho. Apareceu pro lá uma Kombi toda enfeitada com fotos de casas na praia e lotes na cidade de Vitória e a mineirada doida para ter um local nas praias se entregaram ao sonho pelas fotos e plantas falsas.
    Quando foram conhecer apos pagarem algumas prestações que eram cobradas na porta da casas, tiveram a informação que os lotes pela planta estavam dentro do mar. Imagine como sofreram gozações estes pobres sonhadores com o mar.

    Um abração amigo e que Deus nos proteja dos picaretas, já que na politica estamos vulneráveis.
    Bom fim de semana com paz e alegria.
    Bela ilustração com arte.

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  30. As vezes é preciso passar alguns maus bocados para dar valor ao que se tem. Adorei a crônica.

    Beijinho.

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  31. Quando estamos há muitos anos no paraíso, não temos noção do inferno que é viver noutros lados...
    Excelente crónica, como sempre.
    Pedro, tem um bom fim de semana.
    Abraço.

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  32. Só se valoriza o que se tem quando se perde. Ainda bem que eles podiam voltar ao ninho antigo. É que ninho! E que paraíso... Que bela crônica, meu Pedro.
    Forte abraço,

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  33. Tudo acabou bem felizmente para o casal, infelizmente nem sempre assim acontece.
    Gostei de estar aqui!

    Um beijinho

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  34. Meu caro Pedro Luso,
    Gosto de suas crônicas sucintas, objetivas, bem escritas. Esta é um delas. Aproveito este comentário para informar que tenho mais dois blogs, a sua disposição. Se acessá-los faço um registro, mesmo que resumido em uma palavra ou duas, com sua assinatura. Linkes para meus blogs: http://cirandinhapiaui.blogspot.com e abodegadocamelo.blogspot.com
    Abraços
    francisco miguel de moura

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  35. Me gustó mucho el desenlace y el final no me lo esperaba 😊
    Un beso grande

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  36. Assim foi, assim é e assim será: a ilusão da mudança, da vida nova...
    Belíssima crónica, Pedro. Parabéns.

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muito obrigado pela sua leitura e comentário.
Meu abraço a todos os amigos.

Pedro Luso de Carvalho